A BIOTA DAS ÁGUAS INTERIORES
A biota das águas interiores está submetida a uma
série de variados impactos decorrentes das atividades humanas nas diferentes
bacias hidrográficas.
A integridade e o funcionamento dos ecossistemas
aquáticos depende da interação destes com o sistema terrestre, incluindo-se aí
a origem. A diversidade da fauna e flora das águas continentais está
relacionada com os mecanismos de funcionamento de rios, lagos, áreas alagadas,
represas, tais como o ciclo hidrológico, e a variedade de habitats e nichos.
A dinâmica dos ecossistemas de águas continentais e
da sua flora e fauna dependem, portanto, de uma série de fatores
interdependentes. A biota de águas interiores é muito mais diversa e rica do
que a dos oceanos. As águas doces ocupam 0,0093% do volume total de água do
planeta e, no entanto, 12% das espécies animais vivem nas águas interiores
(contra 7% que vivem nos oceanos). Cerca de 40% do total de 20.000 espécies de
peixes vivem nas águas doces.
A flora e fauna dos ecossistemas aquáticos do
Brasil, apresenta inúmeras características relacionadas com o regime
hidrológico dos grandes rios e áreas alagadas e de várzeas. O regime
hidrométrico tem condições altamente flutuantes produzindo-se pulsos de
freqüência e magnitude variadas. Estes pulsos apresentam períodos de inundação
e seca produzindo grandes alterações na estrutura e funcionamento das
comunidades aquáticas.
Adaptação a pulsos significa apresentar mecanismos
de resistência ao dessecamento ou à inundação. No caso de períodos longos de
inundação como ocorre nas florestas inundadas no Amazonas, há mecanismos
bioquímicos especiais da vegetação para tolerância à inundação. Por outro lado
o dessecamento impõe também condições drásticas que produzem respostas da
comunidade para resistir à períodos de intensa seca; existem três mecanismos de
sobrevivência: deixar o sistema quando as condições são adversas; produzir
formas latentes que resistem duráveis que suportam o dessecamento e altas
temperaturas no sedimento.
Plantas e animais desenvolvem estratégias para os
períodos desfavoráreis durante a seca ou inundação. Estas estratégias incluem a
migração de peixes entre o rio e os lagos de várzea, migração de invertebrados
terrestres para a abóbada durante o período de inundação ou a produção de ovos
de resistência, ou estágios de resistência em esponjas e moluscos.
Uma parte importante da biota aquática,
principalmente aquela constituída pelas macrófitas aquáticas, decompõem-se
durante períodos de seca, originando uma massa de detritos elevadas que
sustenta uma flora microbiana extremamente diversificada e ativa. Algas
perifíticas também estão associadas a esta vegetação aquática; estas algas tem
papel importante na interação entre os vários componentes do sistema uma vez
que ciclos biogeoquímicos fechados ocorrem a partir da interação destas
micrófitas com as macrófitas e animais herbívoros ou comedores de detritos.
Grande parte da fauna e flora de rios do semi-árido
tem mecanismos de adaptação ao dessecamento devido a enorme diversidade de tipos
de rios temporários que ocorre na região. Uma parte da flora e fauna do
semi-árido, também está adaptada às flutuações de condutividade/salinidade que
ocorrem. Em muitos rios, represas artificiais ou lagos do semi-árido a
concentração salina/condutividade aumenta com a evaporação, estimulando
mecanismos especiais de controle osmótico devido à maior salinidade.
A fauna de peixes
Um componente importante e fundamental da biota
aquática do Brasil são os peixes. As flutuações do nível nos vários grandes rios
(Amazonas e tributários, e Paraná e tributários) são uma fonte de variabilidade
e fluxo gênico, entre as comunidades dos rios e dos lagos adjacentes. Migrações
e isolamento durante períodos de inundação e seca produzem mecanismos dinâmicos
de alteração da estrutura e função nas comunidades com reflexo nos processos
evolutivos. As muitas espécies de peixes de grandes rios estão adaptadas a
processos de variação hidrométrica e correntes em grandes rios. A fauna de
peixes da biota dos ecossistemas aquáticos do Brasil é fundamentalmente uma
fauna de grandes rios com poucas espécies verdadeiramente lacustres ocorrendo.
Poucos mecanismos de isolamento gênico ocorrem. Os lagos do vale do Rio Doce
são exemplos típicos de ecossistemas aquáticos fragmentados onde isolamento
genético pode ter ocorrido até certo ponto.
Por outro lado a fauna de peixes de represas é
totalmente diversa, devido não só às alterações ambientais causadas pela
construção da barragem, mas, principalmente pela introdução de espécies
exóticas, o que complica relações alimentares e redes tróficas, relações
predador-presa e interfere direta e indiretamente nos processos biológicos que
ocorrem nos lagos artificiais.
Como registro importante da fauna de peixes de rios
do Brasil deve-se considerar a interação de um grande número de espécies de
peixes - mais de 250, com a floresta inundada. O grande número de peixes que
evoluiu com a floresta tropical úmida constitui uma enorme e importante fauna
com alimento diversificado proveniente de sementes e frutos que são uma
importante e fundamental interação evolutiva, e um componente estratégico na
rede alimentar e no uso da energia produzida pela floresta tropical úmida
inundada.
Flora e fauna de reservatórios
A construção de represas produziu grandes alterações
na biota de águas interiores do Brasil. As grandes alterações ocorrem
principalmente com a fauna de peixes, uma vez que as espécies sul-americanas
estão adaptadas a rios com correntes rápidas, migrando para a reprodução.
A
zona pelágica dos reservatórios é muito pouco utilizada pelos peixes. Além da
alteração produzida pela construção de barragens, muitas represas foram
repovoadas com espécies exóticas, tornando a rede alimentar a composição das
comunidades e a exploração comercial extremamente complexas. Tentativas para o
repovoamento das represas com espécies nativas estão em progresso. Áreas
alagadas associadas a represas são a fonte da diversidade e aumento da biomassa
de espécies de peixes, crustáceos, macrófitas, aves e mamíferos.
Impactos na biodiversidade
A biota das águas interiores está submetida a uma
série de variados impactos decorrentes das atividades humanas nas diferentes
bacias hidrográficas e estes são:
- Poluição, contaminação e introdução de substâncias tóxicas;
- Introdução de espécies exóticas predadoras;
- Remoção da vegetação ciliar em rios, represas e lagos;
- Construção de represas;
- Atividades excessivas de pesca;
- Aumento do material em suspensão na água devido a atividades agrícolas;
- Uso excessivo de equipamentos de recreação;
- Deterioração da margem de rios, represas e lagos;
- Remoção e destruição de áreas alagadas;
- Eutrofização excessiva;
- Alteração na flutuação do nível da água e interferência no sistema hidrológico;
- Remoção de espécies de grande importância na rede alimentar;
- Aumento de navegação e transporte;
- Desmatamento em geral e perda da vegetação inundável;
- Intensificação das atividades de mineração;
- Alterações nas condições químicas e físicas das águas (qualidade da água) - temperatura, oxigênio dissolvido, pH (por acidificação), nutrientes (por eutrofização).
Fonte:
Águas Doces no Brasil - Capital Ecológico, Uso e Conservação. 2.° Edição
Revisada e Ampliada. Escrituras. São Paulo - 2002. Organização e Coordenação
Científica: Aldo da C. Rebouças; Benedito Braga. Capítulo 05 - Ecossistemas de
Águas Interiores. J